Por Pedro Figueiredo Neto
A observação de um campo de refugiados ao longo do tempo – de resto, como acontecerá com tantos outros lugares – informa acerca da história e política(s), sobre dinâmicas socioeconómicas e ambientais, sobre o evoluir das relações entre a esfera humanitária e do desenvolvimento, tanto ao nível regional como global. Desde 2012 que acompanho a situação no campo de refugiados de Meheba (Northwestern Province, Zâmbia), com incursões regulares no terreno (2012, 2014 e 2018) observando as várias transformações aí experienciadas, e reflectindo, entre outras coisas, acerca de qual o fim desse lugar muito além da emergência que lhe deu origem, bem como dos respectivos habitantes.
Criado em 1971 com vista a acolher populações que escapavam do conflito angolano, o campo de refugiados de Meheba iria crescer ao longo do tempo. Ecoando os picos de violência regional, o campo viria a receber também indivíduos oriundos da República Democrática do Congo (RDC), Ruanda, Burundi, Somália, entre outros países menos representativos. As sucessivas vagas de refugiados, a par do carácter agrícola (a cada núcleo familiar eram atribuídos cerca de 5ha de terra arável com vista à auto-suficiência), explicam os mais de 720km2 de área deste lugar. Da estrada alcatroada que liga as cidades de Solwezi e Mwinilunga parte a via principal do campo que, ao longo de mais de 35km, articula, em forma de espinha de peixe, os seus oito blocos. Até recentemente, uma leitura sócio-espacial informava, de modo mais ou menos linear, acerca de quarenta anos de conflitos na região. Hoje em dia, Meheba apresenta um panorama sócio-espacial e demográfico bastante mais complexo e heterogéneo, explicitando uma série de transformações políticas, socioeconómicas e humanitárias.
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