YOON | jɒn |, que em idioma wolof pode significar estrada, caminho ou percurso, é um projecto de longa metragem documental, contando também com uma componente de investigação e projecto artístico.
Rodado entre Portugal e o Senegal, atravessando Marrocos e a Mauritânia, YOON lança um olhar sobre determinadas mobilidades e actividades económicas entre Norte e Sul, e que envolvem não só bens e pessoas, mas também informações e ideias. Tudo isto é revelado através dos percursos de Mbaye S., um routier (denominação usada para referir os indivíduos que conduzem carros usados com fins comerciais) que, a cada mês, percorre os mais de 4000 Km de estrada que separam os dois lugares a que chama casa.

A actividade routier é altamente segmentada, envolvendo carros, camiões e autocarros. Os veículos partem de Portugal, Itália, Espanha, França, Holanda ou Alemanha, e têm como destino as geografias dos próprios condutores — Senegal, Mali, Guiné Conakry, Guiné Bissau, entre outros da região. No caso do Senegal, entre os veículos normalmente mais desejados encontram-se os Peugeot 504 e 505, ou antigos modelos de VW Golf, Ford Transit, Toyota Hiace, Hyundai H100 e Mercedes 190. À medida que avançam em direcção a sul, observa-se o renascimento comercial e funcional destes veículos. Tal deve-se não só aos arranjos mecânicos e estéticos efectuados, nomeadamente em Marrocos, mas sobretudo às habilidades e capacidades físicas, sociais e burocráticas dos routiers em navegar os meandros deste caminho. A actividade routier envolve riscos e imprevistos vários que só os indivíduos melhor preparados conseguem gerir.

Contudo, para os routiers, os ganhos não resultam apenas do comércio de carros, nem são exclusivamente económicos. Com efeito, os routiers carregam nos seus veículos uma série de outros itens a serem vendidos, trocados ou entregues, seja ao longo do caminho – com outros comerciantes, mecânicos, migrantes, etc –, seja no destino final – neste caso concreto, em Pikine, periferia de Dakar. Roupa, cobertores e toalhas, sacos de arroz, peças de automóveis e bicicletas, brinquedos, utensílios vários e pequenos electrodomésticos, perfumes e cosméticos, são recorrentes. No entanto, circulam também informações, mensagens, remessas de dinheiro, outras bagagens pessoais. Frequentemente, o objectivo e significado destes elementos vão além do seu carácter funcional ou utilitário. As trocas e os encontros gerados jogam um papel essencial na produção de relações sociais e de reconhecimento social enquanto em movimento.

YOON questiona uma série de ideias associadas ao movimento — de bens, de pessoas, de dinheiro, de ideias e de informações–ilustrando a relevância e necessidade de poder circular entre Norte e Sul, entre Sul e Norte.
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O projecto-filme YOON, dos antropólogos Pedro Figueiredo Neto, investigador do ICS-ULisboa, e Ricardo Falcão, investigador do Centro de Estudos Internacionais-. teve início em 2017, ganhou o concurso de apoio ao documentário do Instituto do Cinema e Audiovisual (ICA-IP) em 2019, e tem estreia prevista para o final deste ano, 2020. O filme tem produção da C.R.I.M. Produções, e está neste momento em fase de finalização.
YOON comporta ainda uma vertente de investigação e de projecto artístico. O processo de rodagem foi, desde o primeiro momento, uma odisseia etnográfica. Sem a componente de investigação antropológica, penetrar neste universo nunca teria sido possível. Parte substancial da informação recolhida ao longo deste processo dará origem a um conjunto de artigos científicos. Além disso, em 2019, YOON ganhou também a GeoHumanities Creative Commissions: Variations on Mobility, uma iniciativa da DiSSGeA -Università degli Studi di Padova e do Royal Holloway, University of London, inserida no projecto ‘Mobility and the Humanities’. Dessa forma, parte dos materiais captados serão retrabalhados e resignificados de forma experimental com o objectivo de criar uma instalação artística audiovisual e sonora.

Pedro Figueiredo Neto (Tomar, 1984), é arquitecto, antropólogo e realizador, actualmente investigador no ICS-ULisboa. O seu trabalho tem focado questões como fronteiras, migrações e deslocamento forçado, campos de refugiados e reassentamentos na África Austral (Angola, Moçambique e Zâmbia). Mais recentemente, tem-se debruçado sobre fronteiras e o movimento de bens e pessoas, entre o Sul da Europa e a África Ocidental.