Prevenção e mitigação de incêndios e participação pública

Por: Ana Delicado, Luísa Schmidt e Filipa Soares

2022 voltou a ser um ‘annus horribilis’ no que respeita aos incêndios. Até ao final de agosto, segundo o ICNF, já tinham ardido em Portugal mais de 100 mil hectares, mais de metade dos quais em povoamentos florestais. Este valor representa um aumento de 36% em relação à média anual dos 10 anos anteriores. Dos quase 10.000 incêndios rurais registados, 16 foram de grande dimensão, consumindo mais de mil hectares. Em termos de área ardida, os distritos mais afetados foram Guarda, Vila Real e Leiria (Figura 1). Um dos casos mais graves em termos de perda de biodiversidade e afetação de recursos naturais foi o incêndio no Parque Natural da Serra da Estrela, tendo consumido mais de 22 mil hectares, ou seja, cerca de 25% da sua área num único verão – o equivalente a uma área superior a duas vezes o concelho de Lisboa (que tem cerca de 10 mil hectares).

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Hub Criativo do Beato: Uma infraestrutura inacabada e ativada

Por: João Felipe P. Brito

Desde o final de 2021, quando comecei a etnografar o Hub Criativo do Beato (HCB), equipamento anunciado há seis anos pelo Governo de Portugal e pela Câmara Municipal de Lisboa (CML) como o mais importante para o desenvolvimento de inovação tecnológica nesta cidade, o “Sónar Lisboa” (abril de 2022) foi o evento que melhor se apropriou dos seus diferentes edifícios e ambientes. Sua organização está diretamente relacionada com os investimentos simbólicos e com as estratégias de promoção internacional que buscam reposicionar Lisboa como capital da inovação e da tecnologia. A escolha do HCB como casa do Sónar, evento de “música, criatividade e tecnologia”, expressa a sua importância nestes investimentos e estratégias, públicos e privados.

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Os micróbios e as contradições nas práticas de consumo ligadas ao risco alimentar

Por: Alexandre Silva e Mónica Truninger

Uma das dificuldades na abordagem ao tema da segurança dos alimentos, do ponto de vista das práticas dos consumidores, consiste na adequação das medidas de prevenção ao carácter multifacetado e até mesmo contraditório do consumo alimentar. Os consumidores parecem por vezes preocupar-se com o risco alimentar, outras vezes parecem não estar nada preocupados com os perigos de contaminação microbiológica dos alimentos e as doenças que pode causar.

Este problema torna-se especialmente difícil de explicar a partir de perspetivas que entendem o consumidor como uma unidade isolada, seja enquanto agente clarividente e calculista ou como uma mera máquina estímulo-resposta, incapaz de refletir e decidir sobre as suas práticas. Mas há um vasto leque de fatores que têm sido realçados no quadro da investigação sobre práticas de consumo, que ajudam a entender o consumidor ao nível meso, isto é, situando-se num emaranhado de influências quer de teor micro – as minudências da vida quotidiana como os tempos, rotinas, sincronização de agendas e espaços, – quer de teor mais macro e estrutural – tipo de comércio e produtos à venda, tipo de família, níveis de educação e escolaridade, níveis de rendimento, modas de consumo, publicidade e media.

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Metápolis: “nem tudo que é sólido se desmancha no ar”

Por: Mariano Macedo

Essas notas visam problematizar o conceito de Metápolis de forma a referenciar a discussão sobre o futuro das cidades. Coloco 4 questões para reflexão.

A primeira questão é relativa ao conceito de metápolis e porque esse conceito emerge como relevante no momento atual de nossa história.  À semelhança de metápolis, outros conceitos vêm se afirmando: cidade informacional, cidade pós-moderna, cidade pós-fordista e pós-metrópolis.      

Esses conceitos procuram identificar as tendências que estão marcando a transição da metrópole tradicional para a metápolis e visam apreender as suas características socioespaciais e conformação morfológica.

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BIODIVERSIDADE 2030. NOVA AGENDA PARA A CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE EM CONTEXTO DE ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS EM PORTUGAL

Por: Rosário Oliveira e João Mourato

A biodiversidade é fundamental, pois dela depende a regulação de processos essenciais à vida como a composição química da atmosfera, do solo, da água, e a capacidade de produção agrícola e florestal. A sua perda afeta inevitavelmente a espécie humana, pelo que a sua conservação é crucial também para a nossa sobrevivência.

Contudo, as estratégias de conservação internacionais, europeias e nacionais não têm sido capazes de travar e inverter a perda alarmante de biodiversidade nas últimas décadas, sendo, assim, necessário ir além das tradicionais medidas de conservação (ex. gestão de áreas protegidas, proteção de espécies ameaçadas, controlo de espécies invasoras).

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Energias renováveis, paisagens e inovação social: o projeto PEARLS

Por: Ana Delicado e Mónica Truninger

É já longa a tradição de investigação sobre questões energéticas no GI SHIFT. Da história da energia nuclear ao futuro da energia da fusão, da pobreza energética às práticas de consumo dos jovens, têm sido múltiplos os projetos envolvendo investigadores do GI. Sobre energias renováveis houve já um projeto financiado pela FCT e está agora em curso outro financiado pela Comissão Europeia. É deste último que vos vamos falar.

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Sustainable futures for whom? Towards an education for interspecies sustainability

By: Maria Helena Saari (University of Oulu)

What does cow’s milk have to do with education and sustainable futures? To explore this question we might ask, as environmental education scholar David Orr has done, if education stems from the word “educe”, meaning “to draw forth” or “bring out”, what is being brought out by the connections between the dairy industry and schools?

Image: Annie Spratt on Unsplash
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Maricultura em Pitangui/RN: género, economia solidária e meio ambiente

Por: José Gomes Ferreira & Winifred Knox

Logo após a declaração do estado de pandemia pela Organização Mundial de Saúde, a 11 de março de 2020, um grupo de investigadores liderado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) submeteu ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) o projeto Boas Práticas de Enfrentamento da Covid-19 no Rio Grande do Norte, na Paraíba e no Ceará,  visando acompanhar as necessidades sociais, económicas e de acesso à saúde das comunidades tradicionais, levando informação sobre saúde e promovendo articulações para diminuir a vulnerabilidade destas comunidades no acesso a serviços públicos. Na qualidade de investigadores do Departamento de Políticas Públicas da UFRN coube-nos o acompanhamento dos pescadores da vila de Ponta Negra, em Natal, e das maricultoras da AMBAP – Associação de Maricultura e Beneficiamento de Algas de Pitangui, no município de Extremoz, situado a 40 km de Natal. 

Além da associação ao projecto Boas Práticas, a investigação surge integrada no projecto de extensão Saberes Dialógicos, coordenado por nós, assim como à Rede Macroalgas coordenada pelo professor Dárlio Teixeira da Escola Agrícola de Jundiaí da mesma Universidade (EAJ/UFRN), incluindo outros especialistas e comunidades que recolhem e transformam algas no Nordeste.

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Lisboa Inovadora e Inclusiva – notas de trajetória, investigação e outros quereres

Por: João Felipe P. Brito

Há doze anos, no Rio de Janeiro, enquanto eu iniciava uma investigação sobre a criação de um novo bairro nos arredores do maior complexo penitenciário da América Latina, não imaginava que a vontade de compreender os porquês daquele processo me traria, um dia, a Lisboa. Aquela inquietação intelectual diante das desigualdades das cidades brasileiras e da mudança social em ambiente urbano resultou em uma dissertação de mestrado sobre estratégias políticas e econômicas que buscavam ressignificar e revalorizar um tradicional e decadente bairro industrial carioca, Bangu, lugar onde nasci e onde primeiro vi o mundo.

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O Perigo da História Única das Alterações Climáticas

Por: Fronika de Witt

Quando rejeitamos a história única, quando percebemos que nunca há uma história única sobre qualquer lugar, recuperamos uma espécie de paraíso.

Chimamanda Adichie: O perigo de uma história única. TED Talk 2009.

A escritora e contadora de histórias nigeriana Chimamanda Adichieto tem vindo a alertar para o perigo das histórias únicas. As histórias únicas, segundo ela, são as perceções excessivamente simplistas e, por vezes, falsas que formamos sobre pessoas e lugares. Estas dependem da perspetiva do narrador e criam estereótipos e imagens incompletas. Outro problema das histórias únicas é onde começam; começar antes ou depois do processo de colonização, por exemplo, muda completamente uma história e a sua dinâmica de poder.

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