Serviço Social Brasileiro no espaço urbano: O trabalho na perspetiva do direito a moradia

Por: Francine Helfreich

O Serviço Social brasileiro apresenta uma relação extremamente próxima com o desenvolvimento das políticas urbanas, sobretudo aquelas que se propõem a enfrentar o déficit habitacional do país, estimado em torno de seis milhões de domicílios, conforme os dados da Fundação João Pinheiro referentes ao ano de 2022. Não há dúvidas que o problema da moradia no país atinge os segmentos mais pauperizados da classe trabalhadora. Dentre eles, destacam-se as mulheres e a população negra, que compõem 54% da população.

Assim, a questão urbana no Brasil engloba uma complexidade de problemas que se articulam entre si. A ausência de regularização da posse da terra, o crescimento das favelas, a insuficiente e ineficaz mobilidade urbana, a falta de assistência técnica de interesse social, o crescimento das milícias policiais mediando a vida nos territórios, as guerras dos grupos civis armados, a política de segurança pública equivocada e, por fim, a negação do direito à cidade nos termos defendidos por Henri Lefebvre, são alguns exemplos que podemos citar. É justamente no conjunto dessas das expressões da questão social – termo usual da categoria profissional – que os assistentes sociais brasileiros executam seu trabalho.

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Considerações sobre smart cities a partir do caso de Florianópolis (Brasil)

Por: Gregório Ayala

Smart Cities representam uma tendência urbana em crescimento, mas sua definição permanece elusiva e frequentemente é moldada pelos interesses dos idealizadores de seus projetos. Embora falte consenso, o termo smart geralmente se refere à integração de tecnologias avançadas, como conectividade, telas e sensores nas paisagens urbanas. O objetivo geral é otimizar recursos, gerar nova riqueza e influenciar o comportamento dos habitantes da cidade (Moroz e Bria, 2019).

Os processos de digitalização urbana são frequentemente associados ao protagonismo estatal e aos interesses corporativos, que tendem a agravar as opressões e injustiças existentes, além de favorecerem economias digitais agressivamente neoliberais (Kitchin, 2015; Couldry e Mejias, 2018). Por outro lado, esses processos também podem ser impulsionados por ativistas urbanos e pelos próprios residentes da cidade, configurando-se como formas de resistência (Anduiza, Cristancho e Sabucedo, 2013; Treré, 2018).

Embora as smart cities não tenham se originado no Sul Global, elas se tornaram uma discussão crucial no Brasil, sendo apresentadas como uma necessidade para os municípios competirem por investimentos. Em 2020, um conjunto de pesquisadores, associações locais e a Prefeitura de Florianópolis, no sul do Brasil, lançou o relatório Smart Floripa 2030. Este projeto ambiciona posicionar a cidade como uma referência nacional para iniciativas Smart.

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Venham ao Fórum da Habitação! (Post promocional-epistemológico)

Por: Marco Allegra

A equipa do projeto LOGO está a organizar o primeiro Fórum da Habitação do projeto no dia 26 de março.

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A interdisciplinaridade na pesquisa sobre mudança climática: reflexões a partir da experiência do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia no Brasil

Por: Julia S. Guivant

O apelo ao estudo interdisciplinar sobre mudança climática passou a ser bastante consensual, com maior número de periódicos publicando artigos com este caráter, e presente em editais de agências de financiamento. Este destaque está intimamente relacionado com a evidência incontestável sobre o papel da influência humana no clima. A interdisciplinaridade é considerada chave tanto para entender como as sociedades interpretam e respondem às mudanças climáticas quanto para formular e orientar na implementação de políticas públicas para mitigação e adaptação. É importante diferenciar a interdisciplinaridade, o estudo de um problema complexo integrando num esforço coletivo diversas perspectivas disciplinares, sem privilegiar um método ou uma teoria disciplinar, da multidisciplinaridade. Esta estuda um tópico a partir da perspectiva de várias disciplinas ao mesmo tempo, sem procurar integrar estas. E se diferencia da transdisciplinaridade, que tende a ser definida como um tipo de interdisciplinaridade, que procura integrar não apenas disciplinas, mas conhecimentos diversos, fora da academia.

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Adaptação climática: governança da água tem de ser mais justa e resiliente

Por: Carla Gomes

As medidas de racionamento de água no Algarve, anunciadas em janeiro pelo governo português para os setores da agricultura, turismo e até o doméstico, são um claro sinal de alerta sobre futuros cenários de escassez. Os eventos climáticos extremos, a maior parte dos quais estão relacionados com a água ou com a falta dela, causaram perdas de meio trilião de euros na Europa nos últimos 40 anos, bem como milhares de mortes. As secas são responsáveis, por si só, por 9 mil milhões de euros anuais de perdas.

O envolvimento dos cientistas sociais é mais crucial do que nunca para enfrentar a crise climática e para garantir uma governança da água mais resiliente e mais justa. Um tema que estará em discussão no dia 19 de Março no ICS-ULisboa, no âmbito do seminário SHIFT “Water justice for climate adaptation” (11h-13h). O documentário “Esta é uma história sobre água”, sobre os problemas e conflitos suscitados pela escassez hídrica no sul de Portugal, será o ponto de partida para o debate, que conta com a presença do realizador.

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Dois anos de Shared Green Deal: balanço das principais atividades

Por: Mónica Truninger

O projeto Europeu Shared Green Deal foi apresentado num post deste blogue há quase dois anos, a 16 de fevereiro de 2022. Naquela altura, o projeto estava ainda no início de um longo percurso de cinco anos. Por isso, vale a pena fazer agora um balanço das principais atividades realizadas passados dois anos, sobretudo aquelas que envolveram mais ativamente os membros do grupo de investigação SHIFT que fazem parte da equipa deste projeto.

Para recordar, o objetivo do Shared Green Deal é estimular ações conjuntas entre parceiros académicos e não académicos em torno de iniciativas promotoras do Pacto Ecológico Europeu (PEE), em toda a Europa. Para tal, estão a ser utilizadas ferramentas das Ciências Sociais e Humanas (CSH) para apoiar a implementação de oito áreas do Pacto Ecológico Europeu, a nível local e regional. Estas áreas são: Energia Limpa, Economia Circular, Renovações Eficazes, Mobilidade Sustentável, Alimentação Sustentável e Preservação da Biodiversidade. O trabalho realizado em cada uma destas frentes vai igualmente contribuir para dois importantes eixos transversais: a ação climática e as ambições de poluição zero do Pacto Ecológico Europeu.

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Incursão livre sobre os dados do Barómetro Habitação da Fundação Francisco Manuel dos Santos

Por: Alda Botelho Azevedo

Dois dias depois da demissão do Primeiro-Ministro António Costa, no âmbito do que viria a ser conhecida como a Operação Influencer, foi publicado o Barómetro Habitação da Fundação Francisco Manuel dos Santos, em que tive o prazer de participar com o João Pereira dos Santos, do Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa. Apesar da atenção mediática e da opinião pública estarem centradas sobretudo no que se passava na arena política, o Barómetro Habitação recebeu ampla cobertura dos meios de comunicação social.

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A energia comunitária em Portugal na transição para as renováveis: uma caracterização preliminar

Por: Vera Ferreira

Em Portugal, no quadro da transição energética, as iniciativas coletivas em torno da energia, ou energia comunitária, permanecem residuais. Não obstante, os enquadramentos legislativos europeu e português encorajam o incremento da produção descentralizada de energia renovável, entendendo-a como uma condição para a participação ativa dos cidadãos no sistema energético e, consequentemente, para alcançar uma transição mais justa e democrática.

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Atrito de inteligências urbanas no urbanismo periférico orientado por dados

Por: Tomás Donadio, Lalita Kraus, Aldenilson Santos e Ramon Carnaval

Desde os anos 1990, consolidaram-se modelos de gestão pública que promovem estratégias de mensuração e monitoramento da vida urbana. Atualmente, estes modelos aliam-se ao acelerado desenvolvimento tecnológico e à sua aclamada função de tornar as cidades mais sustentáveis, humanas e inteligentes. O discurso de cidades inteligentes tornou-se um leitmotif capaz de definir agendas, políticas e projetos urbano-tecnológicos, expandindo infraestruturas computacionais embutidas, distribuídas e integradas no ambiente urbano, como câmaras de vigilância e sensores, somando-se aos dispositivos utilizados individualmente, como redes sociais e aplicações móveis. Entretanto, o urbanismo orientado por dados materializa-se tanto em agendas de cidades inteligentes quanto em iniciativas subalternas, acarretando atritos entre inteligências urbanas divergentes. No Rio de Janeiro, a investigação de ações governamentais e cívicas orientadas por dados contribui para a compreensão de como as lutas pelo direito à cidade avançam de forma agonizante na periferia global. Através de um estudo urbano comparativo, esta investigação explora duas abordagens contrastantes em arranjos sociotécnicos: uma promovida pelo poder público através de uma agenda hegemónica de suposta modernização urbana; outra que emerge nas periferias pela agência da sociedade civil, subversiva e contra-hegemónica.

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Inovações Democráticas: Apontamentos históricos e implicações presentes

Por: José Duarte Ribeiro, João Moniz e Roberto Falanga

A democracia é, essencialmente, sobre a voz dos cidadãos. No entanto, à medida que as sociedades e estruturas políticas evoluem, surge também a necessidade de refinar os mecanismos pelos quais estas vozes são ouvidas e representadas. Nas democracias representativas contemporâneas, essa necessidade advém do acentuado problema da malaise na democracia, que pode ser simplesmente descrito como “um momento em que o ideal de democracia é amplamente amado, mas suas práticas são amplamente criticadas”. É precisamente na abordagem a esta crítica que o termo inovações democráticas surge, mais amplamente conhecido após a definição proposta por Graham Smith.

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