Comentário sobre o livro:
João Ferrão e Ana Horta (orgs.), Ambiente, Território e Sociedade: novas agendas de investigação. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2015.
Que existe de comum entre as preocupações com o consumo alimentar sustentável e com a energia que se consome ou desperdiça? Que pontes e caminhos cognitivos cruzam águas poluídas e lixeiras produzidas pelo homo urbanus? Quais os efeitos que adultos e crianças sentem e sofrem por viverem em ambiente debilitado que lhes afecta a saúde? Que formas de participação cívica e política estão ao alcance dos cidadãos interessados em intervir na construção das condições de melhoria do seu bem-estar? Qual o envolvimento e que tipo de empenho se espera dos decisores públicos na condução de políticas que dignifiquem e valorizem a nossa existência individual e colectiva?
Estas e outras perguntas encontram chaves e soluções de resposta neste livro de amena e enriquecedora leitura, organizado por João Ferrão e Ana Horta, rigorosamente pensado para suscitar inquietações e despertar interesses sobre temáticas presentes no quotidiano social e ambiental em que vivemos. O livro reúne 26 contributos expressamente preparados por um total de 26 co-autores que, a título individual ou de forma integrada, combinam as suas experiências de investigação e proporcionam um roteiro pertinente e atualizado de temas de pesquisa na área de estudos sobre ambiente, território e sociedade. São contribuições diversificadas decorrentes do envolvimento conjunto em atividades de um dos Grupos de Investigação do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, coordenado por João Ferrão, dedicado aos temas explicitados no título do livro. Ao inscreverem e vincarem no terreno a questão crucial da sustentabilidade enquanto temática de estudo das dinâmicas da sociedade contemporânea, os textos reunidos neste volume demonstram a relevância da articulação entre as esferas natural, material, institucional e social da vida humana, bem exemplificada nos diversos estudos de caso apresentados.
As apresentações são deliberadamente sintéticas e indicativas de problemas de pesquisa em fase mais ou menos avançada de elaboração conceptual e teste empírico. Os problemas em abordagem remetem o leitor para escalas que variam entre o nível micro do comportamento do consumidor individual confrontado com escolhas que não são inócuas do ponto de vista da sustentabilidade do ambiente, do território e da sociedade, e o nível macro dos sistemas complexos de ordenamento do território e de planeamento urbano. Nesta multiplicidade de pontos de vista e polissemia de significados obtidos, sobra sempre uma oportunidade para discussão das implicações e impactos que o conhecimento produzido obtém na esfera pública. Daqui resulta um sabor de leitura em que as pequenas doses servidas se combinam e convergem na construção de uma visão prospectiva consolidada sobre os temas que importa discutir numa agenda inovadora dedicada aos problemas do ambiente, território e sociedade.
Uma vantagem adicional que a leitura deste livro proporciona reside na preocupação em atravessar e cruzar fronteiras de pesquisa tantas vezes artificialmente confinadas e limitadas pelo exercício monótono e isolado de disciplinas científicas autónomas. Os primeiros ensaios do livro sublinham de modo pertinente essa dimensão interdisciplinar que permite a economistas, sociólogos, antropólogos, politólogos, geógrafos e outros cientistas sociais discutir de forma aberta e cruzada temas que largamente beneficiam de olhares disciplinares que prescindem do seu próprio espelho. O estudo dos problemas da sustentabilidade ambiental e social convida a sulcar e a atravessar territórios de pesquisa que não se concebem em celas de isolamento disciplinar.
Talvez devesse ter iniciado este breve comentário com uma prévia declaração de interesses: não posso deixar de ler neste livro as linhas e os trajetos de pesquisa que integram um esforço institucional conjunto de posicionamento do ICS em lugar de destaque no panorama das ciências sociais que em Portugal se praticam, visando uma projeção quer a nível nacional como a nível internacional. Trata-se, afinal, de um legítimo conforto de leitura resultante da constatação do excelente trabalho que este Grupo de Investigação do ICS tem sabido produzir, prestando contas a um público alargado sobre a agenda de pesquisa que tem desenvolvido com pleno sucesso, quer pela capacidade de inovação conceptual e metodológica, quer pela riqueza do diálogo que proporciona com interlocutores interessados em partilhar, de forma cúmplice, o valor do conhecimento produzido.
O livro Ambiente, Território e Sociedade: novas agendas de investigação está disponível para compra no site da Imprensa de Ciências Sociais e no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.
José Luís Cardoso é Diretor do ICS ULisboa.
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