Por: ICS FOOD HUB
1. Os sistemas alimentares no centro da agenda política
Os sistemas alimentares têm vindo a ganhar destaque na agenda política internacional como resposta ao contexto global de crise económica, climática, energética e pandémica. Olhar para a alimentação de forma sistémica permite, simultaneamente, atuar sobre a saúde humana, ambiental e económica do planeta. Neste sentido, as Nações Unidas organizaram, em 2021, a Cimeira dos Sistemas Alimentares, em linha com a Estratégia do Prado ao Prato no âmbito do Pacto Ecológico Europeu para a próxima década.
Caminhar neste sentido pressupõe que possamos entender o alimentar para além do alimento, a alimentação para além do setor de produção agroindustrial e, em particular, ampliar o impacto do planeamento alimentar do nível local para escalas mais alargadas, muito com base em redes de cidades que, cada vez mais, prosseguem abordagens neste âmbito, tanto na Europa como a nível global. Este objetivo decorrerá das decisões tomadas a favor da transição alimentar, o que implica intervir num sistema multi-ator complexo, de base territorial, que relaciona o produtor com o consumidor de alimentos, sempre numa ótica de sustentabilidade e de valorização dos serviços dos ecossistemas (Fig. 1).

Fonte: ICS Food Hub
Em Portugal, apesar de se assistir ao surgimento de muitas iniciativas relacionadas com o estabelecimento de circuitos curtos alimentares, os processos que têm por base o planeamento do sistema alimentar numa perspetiva de ordenamento do território e de gestão da paisagem dão ainda os primeiros passos. A aplicação deste conceito à Área Metropolitana de Lisboa (AML) torna-se prioritária, na medida em que importa relacionar o seu sistema alimentar com a região funcional que poderá assegurar o abastecimento alimentar da população metropolitana de forma segura e sustentável.
A Rede Metropolitana de Parques Agroalimentares (RMPA) apresenta-se, assim, como uma proposta para a transição alimentar nesta região, cujo conceito e estratégia foram co-definidos no âmbito do Living Lab de um projeto europeu, sob coordenação do ICS Food Hub.
2. O ICS Food Hub, da investigação à ação
O Food Hub do ICS-ULisboa reúne vários investigadores dos diversos grupos de investigação do ICS e nasceu em 2017 para consolidar um movimento interdisciplinar em torno dos estudos sociais agroalimentares. Este hub pretende ser um eixo aglutinador dos interesses e práticas de pesquisa em torno da alimentação, congregando várias disciplinas e temáticas que se debruçam sobre os estudos territoriais, sociais e culturais agroalimentares. Pretende-se aberto, interdisciplinar e eclético quanto a abordagens teórico-metodológicas, que incluem o ordenamento e gestão do território, processos de significação ideológicos, simbólico-religiosos, sociais, culturais e materiais.
Em novembro de 2020, o ICS Food Hub foi convidado a coordenar um Grupo de Trabalho do Living-Lab do projeto H2020 ROBUST – Unlocking Urban-rural synergies, constituído por uma rede de 20 parceiros locais e regionais. A missão deste Grupo de Trabalho foi definir o conceito de RMPA e a estratégia que melhor poderá assegurar o planeamento e a coordenação do sistema alimentar metropolitano. Em novembro de 2021 os resultados foram apresentados na Conferência de encerramento do projeto .
A RMPA foi, pois, definida como um conjunto diverso de territórios, iniciativas e atores da AML que têm como objetivo o planeamento e a gestão do seu sistema alimentar. Funcionará através de uma plataforma colaborativa de entidades públicas e privadas que prosseguem princípios de sustentabilidade relativamente ao nexus solo, água, biodiversidade e energia, com vista a uma alimentação segura, saudável, inclusiva e responsável da população metropolitana. Promove a economia circular, resiliente e de proximidade, atende à adaptação climática, cria emprego, promove a saúde e o bem-estar e respeita a equidade social. Apoia, ainda, a dieta mediterrânica, reforça a identidade cultural da AML, ao mesmo tempo que incentiva a inovação científica e tecnológica nas diversas componentes do sistema alimentar, contribuindo para a formação, capacitação e sensibilização dos agentes ativos do sistema alimentar e empenhando-se no aumento da literacia alimentar e na transição para a digitalização.
Como visão, a RMPA, em 2030, poderá assegurar 15% do aprovisionamento alimentar da AML, baseado em modos de produção sustentáveis, redes de distribuição de baixo carbono e em circuitos alimentares de proximidade que cumpram com os critérios de inclusão e segurança alimentar. A RMPA contribuirá significativamente para a valorização sócio-ecológica e económica da AML e para o fortalecimento das sinergias urbano-rurais.
O roteiro de ação da RMPA para a próxima década é estruturado por seis objetivos:
- Definição de estratégia de planeamento e gestão do sistema alimentar metropolitano na articulação com o ordenamento e a gestão do território;
- Apoio à organização de circuitos curtos para garantir o abastecimento de proximidade;
- Criação de uma plataforma colaborativa de entidades públicas e privadas para a operacionalização da estratégia e dinamização da RMPA;
- Criação de uma marca própria que certifica os produtos RMPA;
- Promoção de uma campanha de comunicação para a alimentação responsável e promoção da marca RMPA;
- Definição e implementação de um programa de formação, capacitação e educação.
Apresentou-se, ainda, um esquema preliminar para a primeira fase da implementação da RMPA (Fig. 2).

Fonte: ICS Food Hub
Admite-se que esta fase deverá passar por um período experimental de dois anos, cuja prioridade incidiria sobre dois pilares: a justiça social e a justiça ambiental. No primeiro caso, seriam estabelecidos compromissos por via da contratação pública entre produtores agrícolas e escolas, hospitais ou outras instituições com fornecimento de refeições em cantinas, bem como grupos desfavorecidos da população metropolitana. Esta rede poderia ir sendo, progressivamente, expandida para a população com interesse em constituir-se como consumidor comprometido com a RMPA. Relativamente à justiça ambiental, seria relevante identificar áreas de produção piloto que se constituam como exemplos de boas práticas multifuncionais a serem integradas nas estruturas ecológicas municipais e metropolitana, configuradas numa infraestrutura verde.
Na primeira fase de implementação da RMPA deverá decorrer o planeamento territorial do sistema alimentar, incluindo a quantificação e espacialização dos fluxos de recursos, produtos e energia inerentes ao seu funcionamento resiliente e sustentável o que, previsivelmente poderá decorrer da articulação com a elaboração do Programa Regional de Ordenamento do Território e da operacionalização da Estratégia 2030 da AML.
Entretanto, será aprofundada a reflexão para a consolidação do modelo de governança subjacente ao funcionamento da rede e à angariação de financiamento que apoie a implementação do seu programa de ação. Uma vez cumpridas estas duas dimensões, em construção, a RMPA estará … ready to go!
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